“A palavra do momento para a Segurança Pública é integração”

08/02/2019 – O que a Segurança Pública de Santa Catarina tem a ver com a de qualquer outro estado brasileiro? Aparentemente nada, uma vez que os estados guardam autonomia entre si. Mas nada impede que experiências exitosas de um sirvam de exemplo para outros. E a posição de Santa Catarina é exatamente esta: servir de exemplo.

Quem vai fazer o papel de levar os avanços daqui para outros estados é o secretário nacional de Segurança Pública, general Guilherme Theóphilo, que esteve em Florianópolis para conhecer soluções que já estão em prática e trazendo bons resultados. Ele foi todo o tempo acompanhado pelo comandante-geral da Polícia Militar (PMSC), coronel Araújo Gomes.

Comandante da PMSC, Araújo Gomes, explica ao secretário nacional de Segurança Pública sobre as estatísticas e os sistemas de inteligência | Foto: Ascom PMSC

 

A Secretaria Nacional de Segurança Pública (Senasp) é órgão do Ministério da Justiça. E Theóphilo foi convidado pessoalmente pelo ministro Sérgio Moro para assumir a função. O general e o comandante se conheceram ainda durante o governo de transição, quando houve uma breve explanação do que vem sendo feito pelo Estado no que diz respeito à segurança.

“Ali já planejei que a minha primeira saída de Brasília, depois de nomeado, seria para conhecer a experiência de Santa Catarina”, contou, dizendo-se impressionado com o que estava conhecendo. O que mais chamou a atenção do representante do Ministério da Justiça foi o elevado grau de integração entre as diferentes instituições, bem como a informatização.

O secretário nacional elogiou a celeridade e a qualidade dos procedimentos e também a integração com o Tribunal de Justiça. “Pretendo replicar em todo o Brasil o modelo catarinense. A eficácia se revela não só nos investimentos, mas também nos resultados alcançados.” Segundo ele, somente Santa Catarina e São Paulo têm índices de criminalidade de primeiro mundo no país, “e não índices de guerra civil como vemos em muitos estados, comparáveis aos de países que de fato passam por conflitos armados”.

Theóphilo ressaltou que o modelo catarinense de Segurança Pública não é de altíssimo custo, e por isso mesmo torna-se viável e mais barato do que, em momentos de crise, como o que vive agora o estado do Ceará, se solicitar o emprego da Força Nacional.

Ele ainda aproveitou para comemorar o fato de, agora, todos os estados brasileiros e o Distrito Federal integrarem o Sistema Nacional de Segurança Pública. Três estados vinham se negando a aderir ao sistema, pelo qual os estados se comprometem a fornecer dados fidedignos para que a Senasp, dentro de um grande big data, alojado no Sebrae Nacional, possa integrar essas informações. Os últimos estados que aderiram foram Rio de Janeiro, Minas Gerais e São Paulo. Com isso, no dia 15 de março será possível lançar o Sistema, agora atualizado. “Não será mais necessário recorrer ao Atlas de Segurança ou ao Fórum Nacional de Segurança Pública, porque os próprios estados vão fornecer os dados.”

 

Entrevista

Foto: Ascom PMSC

O secretário nacional de Segurança Pública, general Guilherme Theóphilo, concedeu entrevista coletiva à imprensa. Leia abaixo:

 

– O que o senhor viu hoje em Santa Catarina que mais o impressionou e que mais facilmente pode ser replicado em âmbito nacional?

Vi tanta coisa… Mas posso destacar a exigência do nível superior para a entrada dos praças. Isso é muito importante. Outra é a possibilidade de o termo circunstanciado ser feito pela própria Polícia Militar, o que desafoga a Polícia Civil, desafoga as delegacias e agiliza o processo. Comprovado em números! Um flagrante, que com deslocamento gera gasto de combustíveis, ocupa viatura e agentes que poderiam ser deslocados para outra ocorrência, chega a demorar três horas em uma delegacia, pode ser feito às vezes em menos de cinco minutos pelos próprios PMs. Além de toda a tecnologia embarcada, com tablets, câmeras ligadas todo o tempo com cada policial, que depois ajuda em um eventual julgamento… Essa é a integração necessária, muito difícil de ver em outros estados e que aqui funciona muito bem.

– Quais são os planos de sua gestão na Secretaria Nacional de Segurança Pública?

Temos planos estabelecidos de curto, médio e longo prazo. O de curto prazo é para os primeiros 100 dias. Nós estamos lançando o Plano Nacional de Redução de Homicídios para ser implantado em todos os estados. É uma ação urgente! Também estamos ampliando o Banco Nacional de Perfis Genéticos, com o auxílio dos nossos peritos, muito importante para a maior resolubilidade dos crimes, para melhor análise da cena do crime e chegar a um resultado que mostre que o crime não compensa. Hoje o crime está compensando pelo baixo índice de resolubilidade que nós temos, não por culpa da Polícia Civil, mas por falta das ferramentas adequadas. Também buscamos uma padronização das polícias, seja militar ou civil, na formação, na disciplina das academias, na escolha dos comandantes, no uso do critério mérito para as promoções. E, dentro do projeto de lei anticrime, já divulgados pelo ministro Moro, vamos seguir as linhas de trabalho: combate à corrupção, aos crimes violentos e ao crime organizado.

– O Plano Nacional de Redução de Homicídios já tem uma meta? E um prazo?

O plano ainda está sendo elaborado, mas nós pretendemos lançar em cinco municípios pilotos, um em cada região do país, até o final de março, também dentro do projeto dos 100 dias. Para isso, vamos investir em tecnologia, inteligência e fiscalização. Esse tripé deve estar integrado à parte social. Onde o Estado se ausentou, o crime ocupou. Não existem espaços vazios. A meta inicial é a redução de 3,5% dos casos de homicídio a cada ano. Eu trabalhei em Medelín, Cali e Bogotá, na Colômbia, por muitos anos. E testemunhei ações que foram muito eficientes para o país, que tinha as maiores taxas de homicídios do mundo por conta do narcotráfico.

Também trabalhei na Nicarágua, no Haiti e na Europa e, sim, há o que se fazer. Por exemplo, nos bairros mais violentos, e é possível mapear isso perfeitamente, é preciso estabelecer toque de recolher. É implantar Estado de Exceção mesmo! Não é Estado de Defesa e nem Estado de Sítio. As constituições estaduais permitem que o governador faça isso. A partir de meia noite, todo mundo dentre de casa; a partir das 22 horas, proibida a venda de bebida alcoólica; posto de gasolina só pode abastecer veículos, sem vender nada em vasilhames; motos só podem circular com o piloto, sem ninguém na garupa. São medidas simples que têm que ser tomadas para que a população recupere a sensação de segurança e o bandido saiba que está sendo vigiado. São medidas impopulares? São. Mas determinadas situações exigem.

 

Controle do sistema penitenciário

Foto: Wilson Dias/EBC

– Pensando no caminho inverso, o que poderia ser aplicado de outras experiências em Santa Catarina? Temos um problema muito grave que é o sistema prisional, sobretudo com as facções, por exemplo.

A pasta de penitenciárias é afeta a outra secretaria. Mas, como oficial do Exército, participei da Operação Varredura, efetivada em diversos presídios em todo Brasil. Acredito que o que nós precisamos é criar uma Polícia Penitenciária, reforçar a formação dos agentes penitenciários, inclusive com a organização de Força Tarefa de Intervenção Penitenciária. De certa forma já está em ação uma FTIP no estado do Ceará. É preciso disciplinar os presos, colocando para trabalhar, regulando as visitas íntimas, que devem ser uma concessão e não a regra. Quem não tem bom comportamento, também não terá visita. Mais fiscalização, controle para impedir entrada de celulares, armas brancas e outras armas, instalação de escâner de corpo, audiências por vídeo conferência, parlatório para que o preso não tenha contato externo, além da construção de mais penitenciárias de segurança máxima são outras medidas exigíveis. E que os estados consigam manter os seus presídios com a segurança necessária.

 

– Há recursos para atender tantas demandas?

No final do governo passado, o então ministro da Justiça, Raul Jungmann, conseguiu um bom recurso para o Fundo Nacional de Segurança Pública, formado por 2% de tudo o que as loterias federais arrecadam. Em 2019, isso traria R$ 1,2 bilhão para o orçamento da nossa Secretaria. Só que existe a Lei de Teto de Gastos, pela qual só poderíamos acessar R$ 500 milhões. Estamos trabalhando junto à Secretaria do Tesouro Nacional para que haja um alargamento desse limite para a Segurança Pública, afim de que possamos investir mais.

 

– Falamos bastante sobre a repressão ao crime, papel da Polícia Militar. E para as polícias civis dos estados, há algum plano?

É uma prioridade nossa! As polícias civis estão precisando de um olhar mais atento. Até mais do que as militares. Eu percorro todo esse país e vejo que as polícias civis estão muito sucateadas, os efetivos não se recompõem há anos, faltam tecnologia, melhor preparo do pessoal, mais cursos. Sem isso, não vamos elevar o grau de resolubilidade de crimes e delitos. Hoje, a média nacional é de 8%. Isso faz parecer que o crime compensa no Brasil, o que precisa mudar. O endurecimento das leis, que o ministro Moro está propondo agora, com uma polícia civil, investigativa, melhor preparada, nós vamos reverter essa situação rapidamente.

 

– O senhor já está em contato com outros países da região para um trabalho conjunto de enfrentamento ao crime organizado?

Isso está na minha agenda, até porque, como militar do Exército eu comandei Mato Grosso e toda a Amazônia durante seis anos. Participei de uma operação chamada cadeado, em que fechávamos a fronteira com a Bolívia, com o Paraguai, com o Peru, com a Colômbia, com a Venezuela… foram várias operações integradas que, dentro da faixa de fronteira, exige certa liberdade de troca de informações. Essa minha experiência diz que sem cooperação mútua nós não vamos chegar a lugar nenhum. A conversa com os países vizinhos está, sim, na minha agenda, para que a gente consiga impor uma maior presença do governo federal nessas regiões. Inclusive criando uma Polícia de Fronteira. E a minha ideia é que essa Polícia de Fronteira seja composta por pessoas da própria região. Além da agenda de emprego para parte das populações locais, são pessoas acostumadas a andar na selva, no cerrado, ou seja, nas vegetações e no clima típicos das regiões de fronteira. Ao mesmo tempo, pensamos em uma Guarda Costeira, exemplo do que existe nos Estados Unidos, para que esse nosso litoral e os portos sejam mais bem fiscalizados. Outra solução é intensificar o uso das Forças Armadas, junto com as forças de segurança estaduais. Também vamos ampliar o Sistema de Vigilância e Monitoramento de Fronteira, que tem projeto-piloto em Dourados, no Mato Grosso do Sul. Tudo é feito com sensoriamento remoto, canais de satélites, drones just in time.

 

(Pergunta feita ao comandante Araújo Gomes)

O senhor chegou a falar para o general sobre a Operação Ferrolho?

A Operação Ferrolho foi apresentada à Secretaria Nacional de Segurança Pública (Senasp) como bastante exitosa. Inclusive sob a pretensão de torná-la cada vez mais digital e automatizada. A Senasp tem uma grande capacidade de apoiar nosso Estado em investimentos estruturantes. Dou um exemplo: neste momento estamos consolidando uma parceria iniciada no ano passado para a integração do sistema de comunicação via rádio. Esse sistema já contou com investimentos federais e em 2019 vai receber mais recursos, já garantidos, para a instalação de antenas e aquisição de equipamentos que vão propiciar que, em conjunto, Polícia Rodoviária Federal, Polícia Militar, Polícia Civil, Instituto Geral de Perícias e Corpo de Bombeiros utilizem a mesma tecnologia. O ponto positivo dessa visita do secretário Theóphilo é que não foi apenas uma oportunidade de apresentar lições aprendidas e nossos casos de sucesso, mas interagir para a construção de projetos em conjunto.

Theóphilo – A Operação Ferrolho é sensacional. O coronel Araújo Gomes me mostrou hoje como acontece, tudo planejado de forma que em até três horas se consegue fechar todo o estado. Inclusive com acordos com os estados vizinhos, Paraná e Rio Grande do Sul, e também com a Argentina, permitindo a atuação entre os órgãos de Segurança Pública de cada um, o que é fundamental. Cada um resolve seu problema e a Senasp está aí para ajudar. Está na lei que eu tenho que passar 50% do Fundo Nacional de Segurança Pública para os estados. Aos que apresentarem projetos viáveis, e que apresentem prioridades, nós vamos repassar esses recursos. É possível trabalhar bem, fazendo uma gestão com base em fazer mais com menos para oferecer os ganhos que tanto a população brasileira necessita.

(Perguntas feitas ao comandante Araújo Gomes)

Quais as impressões que o general Theóphilo leva da Segurança Pública de Santa Catarina?

Durante visita ao Colegiado da Segurança Pública, ele teve oportunidade de conhecer a Polícia Militar e algumas iniciativas, como o nosso Sistema Mobile, que informatiza o policial na ponta, com tablets, câmeras corporais e o Sistema de Indicadores, Estatísticas e Análise Criminal. Ele também esteve com o presidente do Tribunal de Justiça, Rodrigo Colaço, e conheceu melhor a proximidade entre as forças de segurança de Santa Catarina, extremamente benéfica. Ele ficou bem impressionado com tudo o que viu e conheceu.

 

O senhor falou em um recurso federal previsto para a integração de comunicação via rádio. Do que se trata?

São R$ 13 milhões, integralmente para Santa Catarina, parte de um projeto que está em fase final de aprovação. Tratamos sobre esse assunto aqui durante a visita do secretário. A Senasp já vinha financiando projetos na área de comunicação, já fez aportes ao Estado, e esse novo recurso que está para ser liberado vai propiciar que o projeto de integração da comunicação com a Polícia Rodoviária Federal seja interiorizado. Ele já está pronto para entrar em operação na Grande Florianópolis e na região do Vale do Itapocu.

 

– Ele elogiou os investimentos e, principalmente, os resultados. O que foi mostrado?

A Polícia Militar desenvolveu, a partir do ano passado, uma ótica voltada para resultados, medidos na redução da criminalidade. Em 2018, as estratégias operacionais implantadas implicaram na redução de mais de 230 mortes em relação a 2017, redução de 5.800 roubos em relação a 2017 e redução de mais de 10 mil furtos, também em relação a 2017. Isso demonstra que a estratégia operacional está acertada, uma vez que a queda dos índices se consolida como uma tendência.

Temos também mais encarcerados. No ano retrasado, a entrada de presos era na ordem de quatro por dia. E hoje nós estamos com praticamente 17 por dia. Há ainda uma forte atuação dos programas institucionais preventivos da Policia Militar e da Polícia Civil, como Rede de Vizinhos, Rede Escolar, Rede Catarina, além das ações preventivas, que não resultam necessariamente em prisões, mas que, pela presença da Polícia Militar proativa, reduzem a frequência e a gravidade de crimes, violência e desordem.

(Por Andréa Leonora. Algumas perguntas reproduzidas aqui foram feitas por profissionais de outras empresas de comunicação)