MPT entra com ação contra Seara por descumprir medidas contra covid-19 em unidade de produção de aves

O Ministério Público do Trabalho em Santa Catarina, com apoio do Projeto Nacional de Adequação das Condições de Trabalho nos Frigoríficos do MPT, ajuizou Ação Civil Pública (ACP) contra a empresa Seara Alimentos, do Grupo JBS, no município de Seara-SC, com pedidos em regime de urgência. Documentos enviados pela própria empresa ao MPT apontam graves falhas no procedimento de acompanhamento da saúde dos trabalhadores das unidades de aves e de suínos localizadas no município.

A conduta da empresa não cumpre as exigências de adoção de medidas de controle e contenção da Covid-19 previstas na portaria 312  do governo do Estado de Santa Catarina, na recomendação emitida em março pelo próprio MPT para o setor e, sobretudo, em regras expedidas por órgãos internacionais de saúde. São várias as irregularidades, dentre as quais se destacam a violação ao distanciamento mínimo no setor produtivo; o não fornecimento de máscaras adequadas aos empregados para uso durante o transporte, na medida em que os trabalhadores utilizam máscaras artesanais próprias; a não observância da periodicidade adequada de troca dos respiradores e; a inadequação dos sistemas de ventilação/exaustão em ambientes artificialmente frios, de modo a garantir a efetiva exaustão dos ambientes.

Na ação, os procuradores pedem a imposição de uma série de obrigações à empresa, como testagem obrigatória dos trabalhadores, afastamento de casos suspeitos e confirmados, além de notificação nos sistemas E-SUS-Notifica (http://notifica.saude.gov.br) e Sistra (Sistema de Informação em Saúde do Trabalhador), da Vigilância Sanitária do Estado de Santa Catarina.

As obrigações que o MPT pretende impor à empresa são similares às que constam de Termos de Ajuste de Conduta firmados espontaneamente por outras 102 plantas frigoríficas em todo o país, abrangendo 187.669 empregados diretos. Segundo o MPT, o Grupo Seara/JBS é um dos poucos do setor que se nega, sistematicamente, desde o início da pandemia, a se comprometer com os mesmos níveis de proteção para seus trabalhadores.

A questão mais agravante constatada pelo MPT diz respeito a falhas graves na vigilância ativa e passiva e de monitoramento por parte do Serviço Especializado em Engenharia de Segurança e em Medicina do Trabalho (SESMT) da população de trabalhadores e de casos suspeitos. São irregularidades como o não afastamento precoce de empregados suspeitos de COVID-19, tampouco daqueles que tiveram contato com casos confirmados ou suspeitos da doença, bem como de empregados do grupo de risco. Também foi verificado ao longo da investigação que a empresa não submete os trabalhadores a exames médicos específicos, tampouco à testagem para identificação da Covid-19, o que impede o mapeamento eficaz do estado de saúde de seus empregados.

Dados apresentados pela própria empresa, que foram detalhadamente analisados pelo MPT, revelam casos impressionantes de descaso no controle da pandemia: 198 trabalhadores sintomáticos sem nenhum dia de afastamento; 67 trabalhadores com teste positivo e afastamento informado no sistema diferente do praticado; 100 casos de afastamento tardio (muitos dias após o início dos sintomas), sendo 33 positivos para Covid-19; 671 casos de afastamentos inferiores a 14 dias, sendo 17 positivos para Covid-19; 649 trabalhadores do grupo de risco com atrasos de afastamento entre 81 e 229 dias, sendo que 80 deles manifestaram sintomas compatíveis com a COVID-19 anteriormente ao afastamento e 20 testaram positivo para a doença e; permanência de 5 gestantes em atividade, contrariando a recomendação do Ministério Público do Trabalho em Santa Catarina sobre o tema.

O descumprimento de normas e procedimentos obrigatórios teve como resultado prático um número alarmante de casos de Covid-19 entre os empregados da empresa: 338 dos 3530 empregados das unidades de Abate de Aves e Suínos da empresa em Seara testaram positivo – uma taxa de incidência de 9575 casos para cada 100 mil trabalhadores. Já o Município, com 16.936 habitantes, tinha, conforme boletim epidemiológico datado de 16/11/2020, 727 casos confirmados, uma taxa de incidência de 4292 casos para cada 100 mil habitantes. Ou seja, a taxa de incidência da doença nas unidades da empresa Seara Alimentos é mais do que o dobro do que à do município, mesmo com a já conhecida política de não testagem praticada pela empresa, o que faz presumir que, seguramente, os números são muito piores, gerando grave impacto na saúde pública local.