Transporte - Setor de cargas mais moderno após crise

Entrevista
Ari Rabaiolli

Eles garantiram que alimentos e produtos essenciais chegassem de um ponto a outro em meio à pandemia, mas isso não significa que feles oram não impactados. O setor de cargas e transporte, assim como tantos outros, não será o mesmo depois que tudo passar. A partir de agora, empresários já falam em compartilhamento —palavrinha que veio para ficar com o mundo cada vez mais digital— para reduzir custos e todos já estão muito mais atentos aos negócios fechados pelos e-commerce.

E muito do que é feito para atender aos interesses da cadeia do transporte de cargas, de modo geral, interfere na vida de todos. Seja pelas variáveis que interferem no custo do transporte, que vai parar no preço final das prateleiras do mercado, seja pela infraestrutura rodoviária e de logística que igualmente acaba beneficiando, ou não, toda uma comunidade ou região.
Em entrevista à Pelo Estado, o presidente da Federação das Empresas de Transporte de Carga e Logística no Estado de Santa Catarina (Fetransesc), Ari Rabaiolli,  fala sobre o setor de cargas, a diminuição dos roubos, os gargalos na BR-101 e sobre pedágio.

Confira a entrevista na versão impressa: entrevista Ari Rabaiolli

[Pelo Estado] – Como o setor de transporte de cargas foi impactado pela pandemia? O que o setor leva de aprendizado deste momento?
Ari Rabaiolli – O Transporte Rodoviário de Cargas é o termômetro da economia. Como somos uma atividade essencial, tivemos que garantir o abastecimento e trabalhar neste período, até o momento, com ociosidade em nossos caminhões, principalmente em rotas de curta distância.  Com o comércio ainda fechado na Região Sudeste, São Paulo e Rio de Janeiro, o setor é muito prejudicado. Isso gera ociosidade e sacrifício, da mesma forma em que compromete a rentabilidade das operações.
O que levamos como aprendizado é que se, antes da pandemia, já havia a necessidade de nos reinventarmos, isso é mais necessário agora. Um dos caminhos é a formação de parcerias, no caso, entre as transportadoras. Ou seja, se o caminhão vai para um destino determinado e há espaços no veículo, que haja uma parceria entre as empresas para reunir as mercadorias em uma viagem só. Também temos que começar a pensar em mudar a nossa forma de atuação pelo crescimento de vendas pela internet, o que até então não era tão alto.[Pelo Estado] Quais são as obras rodoviárias esperadas pelo setor e como você avalia a condição da nossa malha viária?
Ari Rabaiolli – Segundo uma pesquisa da Confederação Nacional do Transporte (CNT), a conservação das rodovias de Santa Catarina é considerada com estado regular-ruim-péssimo acima do normal. Em contrapartida, somos privilegiados por termos cinco portos. Tudo o que vem do agronegócio, por exemplo, escoa pela BR 470, cujas obras estão bem atrasadas por conta da falta de recursos. Aliás, as principais obras rodoviárias no Estado são as duplicações das BRs-470 e 280.
Hoje, um caminhão vindo do Oeste com carga destinada à exportação, leva de 2 a 3 horas a mais para finalizar a operação. Isso acarreta em prejuízos maiores para o transporte, o que já é muito elevado, sobretudo ao considerar o custo fixo do caminhão parado, que é de R$ 100/hora, além do custo variável, que inclui aumento do consumo de diesel, desgaste de sistema de freios e outros componentes do veículo.
Isso quer dizer que, por exemplo, considerando a má conservação das rodovias e os gargalos da BR-101 Norte, em que a travessia entre Joinville a Itapema gera congestionamentos impactantes de 2 a 3 horas, temos enorme prejuízo para o setor.  Foi por isso que a Fetrancesc quis entender os prejuízos que o setor tem na travessia entre Criciúma, Grande Florianópolis, Itapema, Balneário Camboriú, até chegar a Navegantes. E, então, contratou a Unisul/Faepesul para fazer este levantamento. Além disso, o custo da logística em SC está acima da média nacional, que tem uma média de 12% e SC está em 14%, devido a estes gargalos da 101, 470, 282 e 280, nestas últimas também por serem pistas simples. Percursos, estes, que têm somado prejuízos para o setor e à sociedade como um todo.[Pelo Estado] – Qual é a opinião da Federação sobre a concessão BR-101 Sul. Os pedágios, em geral, têm trazido o retorno que se espera dessas concessões?
Ari Rabaiolli – A Fetrancesc entende que há a necessidade de concessões das rodovias para que seja garantido o bom estado de conservação. Neste trecho, inclusive, a tarifa de pedágio ficou bastante baixa em relação à realidade nacional, o que garantirá ao trecho da BR-101 Sul os investimentos que a concessionária estimou. Tenho certeza de que no período e percurso de concessão o usuário terá uma tarifa justa, dentro da realidade, com garantia de investimentos futuros.
Os pedágios, em geral, têm retorno onde há tarifas acessíveis. Há regiões como os interiores do Paraná, São Paulo e Rio Grande do Sul, no entanto, que somam prejuízos. O custo do pedágio é uma obrigação do embarcador, no caso de carga lotação, mas no veículo vazio, que com essa pandemia tem ocorrido muito, fica para o transportador ou o autônomo.
Na BR-101 Norte, apesar de o pedágio não ser dos mais elevados, temos sérios gargalos, principalmente durante a temporada de verão, em que em alguns trechos perdemos muito tempo em congestionamentos, como o trecho Florianópolis-Joinville.[Pelo Estado]  – O crescimento do e-commerce exige cada vez mais investimentos em logística. Qual é o panorama de SC neste setor?
Ari Rabaiolli – Todas as empresas que trabalham com carga fracionada e antes da pandemia não se voltavam para o e-commerce, precisam dar atenção a esta atividade, em virtude do crescimento das vendas pela internet. Em Santa Catarina, muitas empresas já estão trabalhando neste sentido, inclusive a minha, e a que não investir neste mercado vai perder muito em volume de carga e faturamento.[Pelo Estado] – Quais são os setores mais relevantes em SC?
Ari Rabaiolli – Com certeza, o mais relevante é o agronegócio, já que 58% das exportações vem deste setor em SC. Além disso, a indústria também é muito relevante e tem poder de recuperação muito rápido em tempos de crise – e não será diferente agora, sobretudo com a política de incentivo do Governo do Estado para produzir kits de protocolos de segurança e respiradores.[Pelo Estado] – Os roubos e furtos de carga caíram 70% e 75% no último ano. O quanto isso representa melhoras e o quanto esses crimes ainda impactam negativamente no setor?
Ari Rabaiolli – A queda nos índices de roubo, furto e saque de cargas em SC representa muito menos prejuízos, traumas para os motoristas que são vítimas destas ocorrências, além de danos para a própria sociedade. O Governo também é lesado, pois deixa de arrecadar impostos, já que o receptador coloca o produto no estoque sem registro e lançamento de notas.Obviamente que também gera danos ao transportador, principalmente quando o veículo não retorna – historicamente, 25% dos veículos vítimas de roubo de cargas não são recuperados. As empresas, além disso, têm suas apólices agravadas pelas seguradoras e participações obrigatórias a partir da segunda ou terceira ocorrência no mesmo ano. Ou seja, o prejuízo é para toda a sociedade, já que, de alguma  forma, todos arcam com os custos, com os prejuízos.