Tensão nos poderes “O governador não conhece o Estado”

Entrevista
Maurício Eskudlark

As últimas semanas entre governo e Assembleia se tornou um capítulo a parte da crise causada pelo coronavírus em Santa Catarina. O ex-líder do governo, deputado Maurício Eskudlark (PL), contou à coluna Pelo Estado como tem sido o bastidor desses dias e também como foi sua passagem pela posição de líder do governo. Para o deputado, o governo de Carlos Moisés (PSL) tem solução, mas isso só virá na base do diálogo franco e transparente com os deputados. Eskudlark lembra que nos quadros do parlamento além de políticos experientes, o governo também pode encontrar pessoas com habilidades técnicas e que poderiam contribuir para construção de soluções conjuntas. Por fim, faz um desabafo e diz que desistiu da liderança após perceber que as portas da Casa D’ Agronômica não estavam de ato abertas para aquele que desafia o governo no parlamento.

“Nunca me abri tanto sobre esse tema como estou fazendo aqui.”

[Pelo Estado] – Como foi essa aproximação com o governo de Carlos Moisés?
Mauricio Eskudlark – Todos os catarinenses queriam que este governo desse certo. Ele ganhou com uma ampla maioria e nós deputados votamos os primeiros projetos.Eu fiz muitas defesas do governo, mesmo não sendo líder naquela época. Um dia fui convidado para ir na Casa D’ Agronômica, um encontro com o governador e o secretário Douglas Borba [Casa Civil], e eles manifestaram intenção de ter um líder que fosse de outro partido, até para mostrar que o governo não era só o PSL.
Aprovamos a reforma administrativa por unanimidade, as coisas estavam indo bem. Aí veio a questão do duodécimo dos poderes, que ele queria reduzir, e aí tivemos alguns problemas, porque os deputados sempre cobraram a criação de mais varas, comarcas, a Justiça mais próxima do cidadão. Ficou complicado defender corte de recursos do Ministério Público e do judiciário porque nós queríamos expansão dos serviços.
Quando eu vi que os deputados não concordavam e que não ia passar do jeito que o governador mandou eu falei com o Douglas e ele falou com o governador para fazermos uma redução negociada. No início o governador concordou, mas voltou atrás. Na votação só os deputados do PSL e Bruno Souza votaram com o governo.

O deputado Júlio Garcia elogiou a escolha e disse para contar com ele no que fosse necessário

[PE] – E como ficou a situação após essas discordâncias?
Mauricio Eskudlark – Após esse episódio ele chamou os sete vereadores que votaram com ele e disse que somente nesses que ele poderia confiar. Nesse momento tive vontade de desistir, mas o Douglas disse que estávamos indo bem e eu fiquei. Depois veio a pauta da taxação do ICMS do agronegócio,  ai foi mais difícil ainda. Eu falei que não tínhamos como taxar e brigar com a principal economia do Estado, quase 70% da economia está em cima do agronegócio, isso afetaria toda Santa Catarina.
Em outra reunião na Casa D’ Agronômica eu chamei o deputado Alba, que era mais próximo do governador, e disse pra ele que nós precisávamos conversar e saber quem é que estava colocando essa ideia de taxar o agronegócio na cabeça do governador. Fomos na mesa e o Alba perguntou quem estava fazendo ele pensar assim. A família dele estava lá e riu. “Isso aí é a cabeça dele. Ele acha que tem que ser tudo produção orgânica”, a filha disse. Eu achei que era um técnico, alguém que estava pressionando, mas aí ficamos sabendo que é uma posição pessoal. Eu disse: “então estamos perdidos”. A população não vai conseguir pagar o preço de produto orgânico.

[PE] – Mas ele sempre foi assim, ou a relação melhorou com o
tempo?
Mauricio Eskudlark – Um dia sentado ao lado dele na reunião do colegiado eu pedi o número do telefone para ligar caso tivéssemos uma demanda urgente, enfim. Ele disse que o telefone é só para a família. Aquilo pra mim foi um choque. Um governador que não aceita estar à disposição 24 horas por dia é complicado. Depois ele disse que pra mim daria, mas aí eu disse que se ele não quer dar eu não quero. Não queria que depois alguém
ligasse pra ele e ficasse pensando que fui eu que passei o número.
Foi um ano difícil. Nosso diálogo ficou complicado. Não conseguíamos conversar, não conseguíamos convencer. Eu fui levando até o final, fazendo a defesa do governo. E eu tinha entrado bem confiante, mas acabei saindo decepcionado.
[PE] – E as decisões de isolamento?
Mauricio Eskudlark – Eu acredito que o governador não conhece bem o Estado, sempre trabalhou no litoral como comandante dos Bombeiros. Enquanto eu briguei para que não parasse o Estado todo, para que fizéssemos uma ação controlada, ele fechou o município de São Carlos onde a indústria que tinha gerou 200 desempregados, sem até ter nenhum caso de coronavírus. Em Salete, a empresa com 500 funcionários parou e até hoje também não tem nenhum caso.

[PE] – Mas os deputados aprovaram a situação de emergência.
Mauricio Eskudlark – Ele pediu menos, fez os decretos de isolamento. A Assembleia mostrando boa vontade aprovou a situação de emergência e aprovou mais do que ele pedia. Na Assembleia temos o presidente Júlio Garcia que já foi conselheiro do Tribunal de Contas e é um deputado super equilibrado, temos o Marcos Vieira que é presidente da Comissão de Finanças há vários mandatos e entende da economia e do orçamento do Estado como ninguém, temos Milton Hobbus que já foi chefiou a Defesa Civil, temos eu e Mocelin na Segurança, o Saretta na Saúde, temos muita gente competente que pode colaborar. E aí surge a denúncia do hospital de campanha, uma empresa suspeita que não tem nenhum médico e enfermeiro nos quadros para fazer o serviço. Pelos estudos que temos essa estrutura seria de no máximo R$ 44 milhões, para onde estavam indo os outros R$ 38 milhões?

[PE] – Não há nenhum diálogo com o governo então?
Mauricio Eskudlark – Na verdade só se consegue falar algo para o governador via Douglas Borba. Ele só ouve o Doulas, ele é que é a decisão.

[PE] – Acha que o projeto para derrubar os decretos prospera?
Mauricio Eskudlark – No momento que o STF disse que os estados têm mais autonomia que a União, nós entendemos que os municípios teriam mais autonomia que o Estado então para essa situação. Eu penso que as coisas poderiam passar a serem definidas pelos municípios e regiões, é uma forma de passarmos, com decisões tomadas com mais cautela que as que o governo do Estado tem tomado.
Salvo alguns, como Gean Loureiro da Capital que fez o que tinha que fazer, porque Florianópolis tem o problema mais duro do Estado, nós temos outros municípios onde se poderia ter mais abertura. Se aprovarmos a declaração de nulidade vamos dar esse poder aos municípios.

Jornalistas
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