Com a Constituição Federal de 1988, a defesa do consumidor foi reconhecida expressamente pelo legislador, tendo em vista a vulnerabilidade e o desequilíbrio na relação de consumo, neste mercado que envolve os dois lados – consumidor e lojista ou prestador de serviços.

Não à toa, diante da complexidade dessa relação, a defesa do consumidor foi caracterizada como direito fundamental da pessoa (art. 5º, inciso XXII, CEF/88) e de princípio constitucional da ordem econômica (art. 170, inciso V, CEF/88).

O Código de Defesa do Consumidor é uma das leis mais democráticas editadas no Brasil, pois foi elaborada com a participação de ONGs, órgãos públicos, Ministério Público, que defendiam consumidores, e também a colaboração de entidades empresariais, que apresentaram diversas sugestões na construção do projeto de lei. Sendo considerado mundialmente um dos mais avançados na tutela dos direitos do consumidor, nosso código serviu de base para a reforma de leis similares por outros países, como Holanda, Portugal, Itália e Canadá.

É uma lei que atingiu as expectativas do consumidor brasileiro, uma lei que pegou rapidamente, um verdadeiro código de cidadania.

Infelizmente – e injustamente -, alguns setores da economia e empresários que visam lucro fácil reagem de forma persistente ao Código de Defesa do Consumidor. Ainda que importante, apenas uma parcela do empresariado mantém esse comportamento atrasado, característico dos que ainda se guiam pelas regras dos séculos XVIII e XIX. Desacostumados a princípios éticos e desrespeitando a dignidade do ser humano nas relações comerciais, esquecem que esse conjunto de regras assegura a livre concorrência, pois, ao impor normas indiscriminadamente sobre o dever da informação, qualidade, segurança e oferta, impede a concorrência desleal e coíbe crimes de ordem econômica.

Esses empresários só não se deram conta ainda da dupla posição que todos ocupamos quando se trata de consumo. Ou seja, se em uma venda ele é o fornecedor, no momento em que compra algo se torna consumidor e também estará protegido pelo código cuja criação comemoramos.

Os governos, em todos os níveis, devem estar atentos para o fato de que o Código de Defesa do Consumidor regula o microssistema jurídico das relações de consumo, que tem influência direta na atividade negocial civil e comercial, na prestação dos serviços públicos de consumo, como água, telefonia, sistema financeiro, energia elétrica, transporte coletivo, etc. E que o mesmo normatizou procedimentos capazes de colocar o cidadão em condições de igualdade com os detentores do poder econômico e perante o próprio Estado-fornecedor.

Cabe aos governos valorizarem a defesa do consumidor, estimulando o fortalecimento do Sistema Estadual de Defesa do Consumidor, com um programa efetivo de municipalização dos Procons nos 295 municípios de Santa Catarina, como prevê a Constituição do Estado e as Leis Orgânicas Municipais. Da mesma forma, devem criar ações permanentes de conscientização e de formação do consumidor-cidadão no sistema educativo, desde o ensino fundamental até o ensino médio. Atualmente, só as faculdades de Direito têm o tema em sua grade curricular, na disciplina de Direito do Consumidor.

Muitas mudanças ocorreram ao longo desses 30 anos. O comércio globalizado, o superendividamento das pessoas, a proteção de dados, por exemplo, constituem desafios para a manutenção e ampliação dos direitos adquiridos. Novas normas têm que ser adaptadas ao Código de Defesa do Consumidor. Se não isso, talvez seja o momento de uma revisão do próprio Código, ampliando os poderes de decisão e a autonomia dos Procons, desafogando o Judiciário e, com isso, os custos envolvidos no andamento dessas ações. Fica um convite para reflexão de todos os lados envolvidos.

 

Elizabete Luiza Fernandes

Diretora PROCON/Florianópolis