Prefeito de Tubarão, Sul de Santa Catarina, e filiado ao PP, na semana passada Joares Ponticelli assumiu a presidência da Federação Catarinense de Municípios (Fecam), que congrega as 21 Associações de Municípios do estado. Nas conversas antes do ato de posse e em eu discurso, Ponticelli deixou claro que sua passagem será marcada por muito trabalho. E muita cobrança! Por exemplo, afirmou que tem grande expectativa quanto ao governo de Jair Bolsonaro. “Enquanto candidato, ele foi muito enfático no pensamento ‘menos Brasília, mais Brasil’. E nós queremos reforçar isso”, avisou. O novo presidente da Fecam quer a valorização dos municípios. Para ele, União e Estado são entes abstratos. Município é concreto. “Ninguém mora no Estado ou na União. Todos nós moramos em uma rua, de um bairro, de um município. Além disso, o nariz do prefeito está mais perto do dedo do cidadão. É no município que as necessidades do cidadão exigem ações e respostas. Por isso o ente mais conhecido e mais próximo tem que ser fortalecido”, disse durante entrevista exclusiva concedida à reportagem da Coluna Pelo Estado.
[PeloEstado] – O senhor tomou posse na terça-feira (15) da semana passada e já tem agendas marcadas para esta segunda-feira (21). Tem pressa?
Joares Ponticelli – Muita, porque temos assuntos urgentes. Na parte da manhã estarei com o secretário da Educação, Natalino Uggioni, com a pauta transporte escolar. Vamos apresentar a defasagem do valor dos convênios, que precisa de uma revisão geral. Esta é uma pauta antiga da Fecam e 292 dos 295 municípios catarinenses dependem dessa revisão para garantir o serviço com a qualidade e a segurança exigidas. Os valores precisam ser corrigidos especialmente pelo peso dos frequentes aumentos do combustível. Estamos fazendo os levantamentos e vamos mostrar ao secretário as perdas que os municípios têm acumulado.
[PE] – Com quem mais deve estar em Florianópolis?
Ponticelli – Com o secretário Paulo Eli, da Fazenda. Vamos trocar informações para começar a preparar toda a nossa defesa na audiência que vamos ter com o ministro Dias Toffoli (atual presidente do Supremo Tribunal Federal), que deve acontecer ainda em fevereiro, para fazer um apelo: que seja pautado o julgamento daquela famigerada liminar do ministro Alexandre Moraes sobre a destinação de recursos do ISS nas operações de leasing, cartões de crédito e de débito, e de planos de saúde. Hoje, todas essas operações feitas aqui em Santa Catarina, ou em outros estados, geram ISS para apenas 25 municípios, que sediam as operadoras. Todos os outros municípios estão perdendo muito! Cito o exemplo de Tubarão. Por conta dessa liminar, nós deixamos de arrecadar em torno de R$ 10 milhões em 2018. É o custo de uma folha de pagamento do município. E uma folha equivale, em média, 50% da arrecadação mensal de qualquer município.
[PE] – Vamos detalhar melhor do que se trata. Foi aprovada uma lei…
Ponticelli – Sim. A Lei Complementar 157, que foi uma discussão de anos no Congresso Nacional, trata do fim da guerra fiscal entre municípios. Depois de uma longa discussão, a lei foi aprovada em 2016 e o presidente Michel Temer vetou o artigo que trata da manutenção dos recursos de ISS no local de origem da operação. O Congresso derrubou o veto e a lei entrou em vigência. Em 2017, as federações de municípios Brasil a fora assinaram convênios com as secretarias da Fazenda, Brasil a fora, para cruzar as informações, uma vez que a alegação para o veto era que os bancos e financeiras não tinham como operacionalizar ou mesmo como saber que valor caberia a cada município. Os convênios com as secretarias estaduais da Fazenda tornou isso viável, tanto que o banco Itaú, nos meses de fevereiro e março de 2018, já tinha começado a recolher para alguns municípios. Mas a Febraban (Federação Brasileira de Bancos), insistindo em manter o imposto nos 25 municípios sedes de bancos, obteve a liminar no dia 23 de março, que está esperando entrar na pauta para julgamento do mérito. E é claro que a Secretaria de Estado da Fazenda tem interesse em ver essa questão resolvida, porque isso vai influenciar diretamente no movimento econômico de Santa Catarina.
[PE] – Mas essa não é uma demanda apenas da Fecam.
Ponticelli – Não! Eu assumi a Fecam com este compromisso, de colocar esta como uma das principais pautas, até porque representa dinheiro novo. Mas já conversei com o presidente da CNM (Confederação Nacional de Municípios), Glademir Aroldi, e ele estará conosco. Vamos levar a Frente Nacional de Prefeitos, com o presidente Jonas Donizete; o deputado Kennedy Nunes (PSD-SC), que vai assumir a presidência da Unale (União Nacional dos Legisladores e Legislativos Estaduais) agora no final de janeiro, também vai à audiência com o ministro Toffoli; e vamos levar o nosso Fórum Parlamentar Catarinense, senadores e deputados federais que já lutam por essa solução. O que nós pleiteamos é Justiça Tributária. Se uma operação é realizada em um município, não é possível que o produto dela seja mandado para Barueri, Osasco… tudo em São Paulo!
[PE] – Na agenda desta segunda, em Florianópolis, vai conversar apenas com os secretários?
Ponticelli – Confirmamos uma audiência, também para segunda-feira, com o governador Carlos Moisés. Com ele, vamos apresentar a pauta da Fecam e começar a discutir questões pontuais. Uma delas é colocar as nossas 21 associações de municípios para ajudarem nesse processo de transição face ao fechamento das ADRs (Agências de Desenvolvimento Regional). Está certo que elas já não tinham mais orçamento e recursos para realizar convênios e empreender ações. Mas a parte burocrática elas ainda cumpriam. Vamos ter que ver como é que vai ficar agora. Tudo bem que o governo pretende ser digital, sem papel, mas como ficam os procedimentos de medições, de convênios, de prestação de contas? Isso não se encerra de uma hora para outra. Tem toda uma cultura burocrática que precisa ser vencida, em que pesem as resistências. Nós, dos municípios, precisamos entender como é que esse novo momento vai funcionar e queremos ser proativos, queremos ajudar.
[PE] – A maior preocupação é com os convênios?
Ponticelli – É, sim. São mais de 400 convênios em curso, entre municípios e Estado, e não sabemos da nova dinâmica. São obras em andamento, são expectativas geradas para a população… Por isso esse encontro com o governador é tão importante. Nós queremos entender o que virá e disponibilizar a energia das 21 associações de municípios que, melhor do que ninguém, conhecem a realidade de cada região. É possível, por exemplo, realizarmos uma parceria com o Estado no sentido de otimizar a energia que nós temos com aquilo que o Estado tem. Afinal, pessoas lotadas nas ADRs vão continuar nas regiões e podem ser alocadas nas próprias associações.
[PE] – A Fecam e as Associações de Municípios podem vir a pedir a reedição do Fundo de Apoio, o Fundam?
Ponticelli – O Fundam teve um grande papel! Descentralizou recursos de forma efetiva e produziu excelentes resultados para Santa Catarina. Eu não sei de Fundam, o nome não me interessa. Mas nós queremos, sim, um mecanismo que possa dar continuidade a esse processo de distribuição de recursos, porque são os Executivos municipais que conhecem melhor a realidade das cidades. Eles estão mais próximos das necessidades do cidadão e por isso podem eleger as verdadeiras prioridades. O problema na coisa pública é quando a decisão é tomada de longe e deixa de fora a verdadeira prioridade. Temos programas de governo criados em laboratório eu nem sempre atendem as necessidades de estados e municípios. Isso ocorre especialmente da parte do governo federal. O pouco recurso que recebemos para a Saúde, vem distribuído em programas e rubricas orçamentárias que Brasília decide, mas que nem sempre representam a necessidade local.
[PE] – No dia da posse o senhor falou de pautas específicas com todos os poderes. É possível resumir essas pautas?
Ponticelli – Na Assembleia, queremos ter uma atuação permanente para orientar sobre pautas que podem ajudar ou prejudicar os municípios. Com o Tribunal de Justiça nós temos várias demandas e a principal é o pagamento de precatórios que está esgotando a capacidade de crescimento dos municípios. Tem um projeto tramitando em Brasília para que haja um financiamento aos municípios para que tenham capacidade de pagamento. No Tribunal de Contas também temos várias demandas, assim como com o Ministério Público e entidades. Com a Fiesc e a Fecomércio, por exemplo, nós queremos participar das discussões sobre a eliminação dos incentivos fiscais, porque isso também nos afeta. Pautas que serão definidas na primeira reunião da nova diretoria da Fecam, que deve acontecer na primeira quinzena de fevereiro.
[PE] – Qual é a expectativa com a Marcha de Prefeitos a Brasília, que já se tornou tradicional? E, até agora, os governos Bolsonaro e Moisés têm agradado aos que defendem o Municipalismo?
Ponticelli – Muito grande, até porque é a primeira do presidente Bolsonaro que, enquanto candidato, foi muito enfático no pensamento “menos Brasília, mais Brasil”. E nós queremos reforçar isso. Quanto aos governos, é muito cedo para avaliar. São ainda muito jovens, estão tateando, conhecendo as estruturas. Mas isso não impede de já colocarmos nossas pautas municipalistas para que toda a configuração do governo as leve em conta.
[PE] – Incluindo a Reforma Tributária, que o senhor tratou como utópico em seu discurso de posse?
Ponticelli – A Reforma Tributária, falada e acalentada há tanto tempo, se mostra utópica por simples Matemática. Cada ente federativo quer aumentar a sua arrecadação. E o dono do dinheiro, que é o contribuinte, quer a redução da carga tributária, ao mesmo tempo em que espera receber mais serviços públicos e de qualidade. Os entes que recebem os tributos querem, cada um, aumentar o seu quinhão. Só que se o dinheiro é o mesmo e o contribuinte quer pagar menos, como é que faz para aumentar o recolhimento? Construir essa solução vai exigir muita energia. Por isso que temos que atacar no que pode produzir resultados mais rápidos, caso do ISS dos bancos e da desvinculação dos recursos que o governo federal repassa aos municípios. Isso pode aumentar a eficácia do serviço público municipal da Saúde, por exemplo, sem aumento de repasse.
Por Andréa Leonora
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Foto: Mafalda Press